Dos Símbolos Teriomórficos e das Visões Apocalípticas

Um insight em C. Jung

Parece haver, nos estudos em psicologia profunda, margem empírica para compreender algo da natureza onírica das religiões primitivas, donde uma contraposição à natureza onírica das religiões históricas nascentes ou morrentes. Porque, segundo apreendeu C. Jung, os conteúdos que são mais proeminentes e vultuosos na vida diurna, por estarem tão determinantemente vinculados à consciência, aparecem apequenados nos processos visionários ou oníricos, uma vez que há uma relação de inversão de tonalidade e de valor entre o que é consciente e aquilo que pertence à Sombra. Isso significa que, dominados pela emergência numinosa de arquétipos, assumidos como realidades objetivas e manifestações exteriores, donde os assombros lúcidos da presença terrível das divindades a todo o instante da vigília e em todos os lugares, os primitivos raramente conheceriam sonhos de tipo apocalíptico — as divindades que lhes eram titânicas durante o dia, apareciam-lhes muito reduzidas à noite, como pequenos animais simbólicos ou elementos sutis, reinterpretados, no desperamento matutino, como mensageiros ou guias (psicopompos) dos deuses, o que transparecerá, também, nos repentes visionários, com oráculos esfíngicos e formas abstratas.

…os conteúdos que são mais proeminentes e vultuosos na vida diurna […] aparecem apequenados nos processos visionários ou oníricos…

É principalmente nos tempos de nascedouro e de definhamento de religiões históricas, com crises no Sagrado e desordens exteriores, associadas a um aumento geral do cinismo, do ceticismo e do hedonismo, quando o mundo exterior já não conhece os efeitos cosmológicos do culto olimpiano e quando fica parecendo que os deuses estão abandonando os homens, deixando espaço para a profusão ‘daemoníaca’, e tudo fica prenhe de potestades menores, que os sonhos se tornam escatológicos, tremendamente potentes, e a divindade neles se manifesta com o peso total de sua presença aterradora. Esses tempos conhecem o nascimento e o alastramento da mística e das experiências visionárias terrificantes, cheias de monstruosidades oceânicas, de anjos ininteligíveis, de tronos relampejantes e de formigamentos de toda a sorte de pragas do Abismo.

Esses são os sonhos de nossa época.

Texto de minha autoria (como os demais deste canal) originalmente publicado em meu perfil pessoal do facebook em 18 de Novembro de 2023.